Violência Zero!
O cavalo evoluiu até chegar ao que é hoje desde longínquos
55.000.000 de anos, transformando-se de um animal de 40 cm de altura até
o garboso e belo animal que é hoje.
Apesar desta sua evolução em tamanho e altura, desde estes tempos imemoriais o cavalo baseia sua vida em alguns preceitos evolutivos que lhe permitiram sobreviver.
A maioria destes preceitos são oriundos da busca pela sobrevivência, como a convivência em bandos e o deseja pela liberdade que permite correr de seus algozes.
O cavalo sempre viveu em manadas e em liberdade, mas criando uma hierarquia social de forma que um animal assume o papel de líder dominador, com papel bem definido para que não haja conflitos entre seus pares. Essa hierarquia é estabelecida por critérios de força, idade, experiência, coragem etc.
A presença do denominado líder alfa faz com que o rebanho tenha seus caminhos e atitudes de sobrevivência guiados de forma a permitir a melhor integração e convivência possível. Em tempos de paz e tranqüilidade, em geral, essa posição cabe à égua mais velha e mais experiente que será a responsável pela escolha dos melhores locais para o rebanho. Quando o rebanho for ameaçado, essa posição será tomada pelo garanhão reprodutor, que imediatamente assume a posição para levar os animais a um porto seguro, ou então partirá para defender o rebanho.
O conhecimento desta hierarquização do mundo equestre, assim como de todas as informações possíveis do comportamento e atitudes dos equinos, nos permite usufruir e compreender melhor o mundo dos cavalos e desta forma usufruir de seu máximo potencial.
Se um cavalo depende de seu líder ala para indicar o que fazer e não reconhecer esse líder alfa, ele tende a assumir essa posição. Isso se torna fundamental em nossa lida diária com os cavalos, pois a todo o momento, o cavalo buscará reconhecer em nós essa liderança e, muitas vezes, coloca em duvida essa liderança buscando assumir o controle. Então dependerá de como agirmos, para manter nosso controle, de forma, não a submetê-lo a nossos desejos, mas sim, fazer com que aceite essa nossa liderança sem mais questionamentos, sem buscar a submissão através da punição, mas sim buscando a submissão pela aceitação incondicional de nossa liderança buscando utilizar as ferramentas de comunicação que o próprio animal utilizaria com os seus, que vem pela confiança em nossas atitudes para com ele e o meio em que vive.
Outro fator importante a ser levado em consideração, é que a 3ª lei de Newton da física, também pode e deve ser aplicada aos cavalos. Essa lei diz que “Para toda ação aplicada a um corpo, esse responderá com a mesma intensidade em sentido oposto”. Para os cavalos, podemos dizer da seguinte forma: “O que se fizer aos animais, este responderá na mesma forma e mesma intensidade. Se o tratares bem, assim serás correspondido. Se o maltratares, em dado momento, assim ele o fará.”
Essa breve introdução com base científica e em estudos do comportamento do cavalo e sua interação com o mundo foi feita de forma a poder chamar a atenção para a desnecessária violência a que frequentemente nossos amigos eqüestres são submetidos.
Violência essa cometida por “gente do cavalo”, que vive do cavalo, para o cavalo e que se beneficiam financeiramente destes animais.
Pode até ser que essa violência seja causada por pura ignorância, mas o que vemos ainda é a falta de regulamentação, fiscalização e, em verdade, muitas vezes de interesse em se coibir esses abusos contra os animais.
Estamos aqui falando da violência cometida e vista a céu aberto em eventos eqüestres de quase todas as raças de equinos, quer sejam eventos de morfologia como eventos esportivos. E os juízes, árbitros, organizadores e as associações que apóiam e muitas vezes são responsáveis por esses eventos pouco fazem para melhorar e preservar a saúde dos cavalos.
Cabe ressaltar que em todas as raças e associações existem sim pessoas que se preocupam, que cuidam dos animais da forma correta, mas infelizmente, muitas vezes, sua voz parece se perder na multidão que fere os animais.
Apenas para citar alguns, o uso indiscriminado de esporas com rosetas pontiagudas e freios com grandes pernas em algumas raças de esporte, por exemplo. Essas ajudas, quando bem utilizadas por ginetes experientes podem servir para mostrar ao cavalo da forma correta o que deve ser feito. Mas o que vemos em muitos eventos são cavaleiros sem a mínima preocupação na dor e mal que isso causa aos animais. Algumas entidades, em eventos oficiais já algum tempo fiscalizam os animais antes e depois das provas de forma a observar a presença de lesões nos animais e coibir os abusos. É uma excelente atitude, mas o absurdo é ter gente, que se diz do cavalo e que precisa ser fiscalizada para não machucá-lo.
Já vi o mesmo ocorrer em eventos de raças de marcha. Cavalos sangrando pela boca, pelo uso errôneo de freios mais pesados que o necessário, nas mãos de quem não o sabe usar. Felizmente, isso ainda não é moeda corrente nessas raças. Ainda.
Em exposições de morfologia de outras raças de marcha, muitos apresentadores preparam seus cavalos na chibata antes de entrar em pista, onde seus animais deverão ser apresentados em estação (parados). A desculpa é que devem estar atentos. E os juízes ressaltam essa “atenção”, como animal “esperto”. Pobres cavalos.
Ao inquirir apresentadores de determinada raça do porque fazer esse “preparo”, a resposta foi ”ele sabe”. Diz que o animal vem de linhagem de pais ruins, e que apanham apenas para garantir que na pista eles devem se comportar. Ora, como o animal pode comportar se apanha? Qual a reação que deve advir se a ação foi bater?
Na ultima nacional de uma grande raça há poucos meses, a qual proibiu a entrada de apresentadores com chicote ou similar em pista para coibir essa violência, observamos a “esperteza” destes apresentadores. Entram agora com guia de mais de três metros, de forma a ficarem rodando-a e poderem utilizar para “acertar” o cavalo em sua posição correta para a morfologia. E os juízes adoram observar os cavalos ‘atentos’ valorizando isso sem se atentarem que essa atenção foi conseguida na base da violência. Ou sem se preocuparem.
Nesse mesmo evento, em uma prova funcional, antes de entrar em pista, diversos ginetes estavam a chicotear e maltratar seus cavalos antes de entrar em pista, somente parando quando determinado expectador e criador foi chamar a atenção dos juízes pela crueldade a que os animais estavam sendo submetidos. O juiz então, e somente então, chamou a atenção daqueles que maltratavam os animais, proibindo de entrar em pista se assim o continuassem.
E isso tudo foi à vista de todos. Imaginem nos bastidores. Imagine nas propriedades, centros de treinamento, haras e fazendas. Isso ocorre com freqüência inimaginável, e totalmente desnecessária.
E isso atinge níveis e proporções grandes quanto maior foi o envolvimento financeiro. Há pouco tempo saiu em diversos órgãos de imprensa que a equipe olímpica de um tradicional país do meio equestre foi dissolvida por envolvimento de quase todos os membros em dopping dos animais. Isso também é uma violência cometida contra eles. Faz-se o dopping para obrigar o animal a fazer algo além de suas forças, além de sua capacidade. E ele paga caro por isso, muitas vezes com a própria vida.
Na Bolívia assisti a uma corrida de cavalos, onde três dos cinco animais envolvidos sofreram de sangramento das vias respiratórias por uso de substancias que os fizeram correr além de sua capacidade.
Mensalmente lemos nas paginas desta revista dicas e comentários de pessoas do mundo do cavalo, que se mostram preocupadas em compreender e entender os animais. Muitas dessas pessoas mostram e provam que a compreensão do cavalo é mais benéfica que a submissão pela força. O cavalo responde melhor. O cavalo vive mais. O cavalo ganha mais. Ganha qualidade de vida e competições.
E certamente nós também podemos ganhar.
Uma renomada estudiosa americana do comportamento animal, Temple Grandim, em seu livro, na “Lingua dos Bichos”, diz que “Se nos interessamos pelos animais, então precisamos estudar os animais pelo bem estar deles, e nos termos deles, até onde isso for possível. O que eles estão fazendo? O que estão sentindo? O que pensam? O que estão dizendo? Quem são eles? O que precisamos fazer para tratar os animais com justiça, responsabilidade e bondade? As pessoas podem aprender a falar com os animais e a ouvir o que os animais têm a dizer. Essas pessoas são mais felizes que as que não podem. Exercer ou impor a dominância não significa bater no animal até ele se submeter. Exercer ou impor a dominância significa usar o método natural de comunicação do animal”.
Desta forma, ao trabalharmos com um animal, quer seja para provas esportivas, quer seja para provas de morfologia, se o fizermos com calma e tranqüilidade, mostrando para o animal o que deve ser feito de forma correta e simples, firme, sem demonstrar qualquer sentimento de agressão ou receio deste animal e fizermos nos valer do conhecimentos do comportamento do animal, de como ele age e interage com o meio ambiente, certamente obteremos melhores resultados e um melhor relacionamento.
André G. Cintra
MV, Prof. Esp.
Mestrando em Etologia Equina – FZEA USP
Apesar desta sua evolução em tamanho e altura, desde estes tempos imemoriais o cavalo baseia sua vida em alguns preceitos evolutivos que lhe permitiram sobreviver.
A maioria destes preceitos são oriundos da busca pela sobrevivência, como a convivência em bandos e o deseja pela liberdade que permite correr de seus algozes.
O cavalo sempre viveu em manadas e em liberdade, mas criando uma hierarquia social de forma que um animal assume o papel de líder dominador, com papel bem definido para que não haja conflitos entre seus pares. Essa hierarquia é estabelecida por critérios de força, idade, experiência, coragem etc.
A presença do denominado líder alfa faz com que o rebanho tenha seus caminhos e atitudes de sobrevivência guiados de forma a permitir a melhor integração e convivência possível. Em tempos de paz e tranqüilidade, em geral, essa posição cabe à égua mais velha e mais experiente que será a responsável pela escolha dos melhores locais para o rebanho. Quando o rebanho for ameaçado, essa posição será tomada pelo garanhão reprodutor, que imediatamente assume a posição para levar os animais a um porto seguro, ou então partirá para defender o rebanho.
O conhecimento desta hierarquização do mundo equestre, assim como de todas as informações possíveis do comportamento e atitudes dos equinos, nos permite usufruir e compreender melhor o mundo dos cavalos e desta forma usufruir de seu máximo potencial.
Se um cavalo depende de seu líder ala para indicar o que fazer e não reconhecer esse líder alfa, ele tende a assumir essa posição. Isso se torna fundamental em nossa lida diária com os cavalos, pois a todo o momento, o cavalo buscará reconhecer em nós essa liderança e, muitas vezes, coloca em duvida essa liderança buscando assumir o controle. Então dependerá de como agirmos, para manter nosso controle, de forma, não a submetê-lo a nossos desejos, mas sim, fazer com que aceite essa nossa liderança sem mais questionamentos, sem buscar a submissão através da punição, mas sim buscando a submissão pela aceitação incondicional de nossa liderança buscando utilizar as ferramentas de comunicação que o próprio animal utilizaria com os seus, que vem pela confiança em nossas atitudes para com ele e o meio em que vive.
Outro fator importante a ser levado em consideração, é que a 3ª lei de Newton da física, também pode e deve ser aplicada aos cavalos. Essa lei diz que “Para toda ação aplicada a um corpo, esse responderá com a mesma intensidade em sentido oposto”. Para os cavalos, podemos dizer da seguinte forma: “O que se fizer aos animais, este responderá na mesma forma e mesma intensidade. Se o tratares bem, assim serás correspondido. Se o maltratares, em dado momento, assim ele o fará.”
Essa breve introdução com base científica e em estudos do comportamento do cavalo e sua interação com o mundo foi feita de forma a poder chamar a atenção para a desnecessária violência a que frequentemente nossos amigos eqüestres são submetidos.
Violência essa cometida por “gente do cavalo”, que vive do cavalo, para o cavalo e que se beneficiam financeiramente destes animais.
Pode até ser que essa violência seja causada por pura ignorância, mas o que vemos ainda é a falta de regulamentação, fiscalização e, em verdade, muitas vezes de interesse em se coibir esses abusos contra os animais.
Estamos aqui falando da violência cometida e vista a céu aberto em eventos eqüestres de quase todas as raças de equinos, quer sejam eventos de morfologia como eventos esportivos. E os juízes, árbitros, organizadores e as associações que apóiam e muitas vezes são responsáveis por esses eventos pouco fazem para melhorar e preservar a saúde dos cavalos.
Cabe ressaltar que em todas as raças e associações existem sim pessoas que se preocupam, que cuidam dos animais da forma correta, mas infelizmente, muitas vezes, sua voz parece se perder na multidão que fere os animais.
Apenas para citar alguns, o uso indiscriminado de esporas com rosetas pontiagudas e freios com grandes pernas em algumas raças de esporte, por exemplo. Essas ajudas, quando bem utilizadas por ginetes experientes podem servir para mostrar ao cavalo da forma correta o que deve ser feito. Mas o que vemos em muitos eventos são cavaleiros sem a mínima preocupação na dor e mal que isso causa aos animais. Algumas entidades, em eventos oficiais já algum tempo fiscalizam os animais antes e depois das provas de forma a observar a presença de lesões nos animais e coibir os abusos. É uma excelente atitude, mas o absurdo é ter gente, que se diz do cavalo e que precisa ser fiscalizada para não machucá-lo.
Já vi o mesmo ocorrer em eventos de raças de marcha. Cavalos sangrando pela boca, pelo uso errôneo de freios mais pesados que o necessário, nas mãos de quem não o sabe usar. Felizmente, isso ainda não é moeda corrente nessas raças. Ainda.
Em exposições de morfologia de outras raças de marcha, muitos apresentadores preparam seus cavalos na chibata antes de entrar em pista, onde seus animais deverão ser apresentados em estação (parados). A desculpa é que devem estar atentos. E os juízes ressaltam essa “atenção”, como animal “esperto”. Pobres cavalos.
Ao inquirir apresentadores de determinada raça do porque fazer esse “preparo”, a resposta foi ”ele sabe”. Diz que o animal vem de linhagem de pais ruins, e que apanham apenas para garantir que na pista eles devem se comportar. Ora, como o animal pode comportar se apanha? Qual a reação que deve advir se a ação foi bater?
Na ultima nacional de uma grande raça há poucos meses, a qual proibiu a entrada de apresentadores com chicote ou similar em pista para coibir essa violência, observamos a “esperteza” destes apresentadores. Entram agora com guia de mais de três metros, de forma a ficarem rodando-a e poderem utilizar para “acertar” o cavalo em sua posição correta para a morfologia. E os juízes adoram observar os cavalos ‘atentos’ valorizando isso sem se atentarem que essa atenção foi conseguida na base da violência. Ou sem se preocuparem.
Nesse mesmo evento, em uma prova funcional, antes de entrar em pista, diversos ginetes estavam a chicotear e maltratar seus cavalos antes de entrar em pista, somente parando quando determinado expectador e criador foi chamar a atenção dos juízes pela crueldade a que os animais estavam sendo submetidos. O juiz então, e somente então, chamou a atenção daqueles que maltratavam os animais, proibindo de entrar em pista se assim o continuassem.
E isso tudo foi à vista de todos. Imaginem nos bastidores. Imagine nas propriedades, centros de treinamento, haras e fazendas. Isso ocorre com freqüência inimaginável, e totalmente desnecessária.
E isso atinge níveis e proporções grandes quanto maior foi o envolvimento financeiro. Há pouco tempo saiu em diversos órgãos de imprensa que a equipe olímpica de um tradicional país do meio equestre foi dissolvida por envolvimento de quase todos os membros em dopping dos animais. Isso também é uma violência cometida contra eles. Faz-se o dopping para obrigar o animal a fazer algo além de suas forças, além de sua capacidade. E ele paga caro por isso, muitas vezes com a própria vida.
Na Bolívia assisti a uma corrida de cavalos, onde três dos cinco animais envolvidos sofreram de sangramento das vias respiratórias por uso de substancias que os fizeram correr além de sua capacidade.
Mensalmente lemos nas paginas desta revista dicas e comentários de pessoas do mundo do cavalo, que se mostram preocupadas em compreender e entender os animais. Muitas dessas pessoas mostram e provam que a compreensão do cavalo é mais benéfica que a submissão pela força. O cavalo responde melhor. O cavalo vive mais. O cavalo ganha mais. Ganha qualidade de vida e competições.
E certamente nós também podemos ganhar.
Uma renomada estudiosa americana do comportamento animal, Temple Grandim, em seu livro, na “Lingua dos Bichos”, diz que “Se nos interessamos pelos animais, então precisamos estudar os animais pelo bem estar deles, e nos termos deles, até onde isso for possível. O que eles estão fazendo? O que estão sentindo? O que pensam? O que estão dizendo? Quem são eles? O que precisamos fazer para tratar os animais com justiça, responsabilidade e bondade? As pessoas podem aprender a falar com os animais e a ouvir o que os animais têm a dizer. Essas pessoas são mais felizes que as que não podem. Exercer ou impor a dominância não significa bater no animal até ele se submeter. Exercer ou impor a dominância significa usar o método natural de comunicação do animal”.
Desta forma, ao trabalharmos com um animal, quer seja para provas esportivas, quer seja para provas de morfologia, se o fizermos com calma e tranqüilidade, mostrando para o animal o que deve ser feito de forma correta e simples, firme, sem demonstrar qualquer sentimento de agressão ou receio deste animal e fizermos nos valer do conhecimentos do comportamento do animal, de como ele age e interage com o meio ambiente, certamente obteremos melhores resultados e um melhor relacionamento.
André G. Cintra
MV, Prof. Esp.
Mestrando em Etologia Equina – FZEA USP
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