Home Sobre o CAMPOLINA Artigos Ana Carolina Passos Bem estar animal Bem estar animal em eqüinos de pista
Quando ouvimos falar em Bem Estar Animal,
imediatamente passa em nossas cabeças que se trata de algo referente à
vivisseção, animais de circo ou até mesmo animais de rodeio. Nunca
prestamos atenção nos nossos próprios atos para com nossos animais, no
que contribuímos ou não para o bem estar dos nossos valiosos cavalos que
freqüentam as pistas de julgamento. Na verdade, o bem estar de um indivíduo é o seu estado em relação às suas tentativas de adaptar-se ao seu ambiente e pode ser classificado em ADEQUADO ou POBRE, ou mesmo como alto e baixo grau de bem estar.
Os animais, assim como os humanos,
possuem vários sistemas funcionais que controlam a temperatura corporal,
estado nutricional, sociabilidade, entre outros. Juntos, estes sistemas
controlam as interações entre o indivíduo e o ambiente, mantendo seu
estado em uma variação tolerável. Quando o animal se encontra em
desajuste real ou potencial, ou quando é obrigado a realizar uma ação
devido a uma situação ambiental, diz-se que este animal tem uma
NECESSIDADE. Logicamente, quando essa necessidade não é satisfeita, o
bem estar é mais pobre do que em uma situação na qual ela está
satisfeita. As exposições são exemplos claros de mudança drástica nas
condições do ambiente com efeitos sobre o bem estar do animal por
inúmeros fatores.
Um exemplo específico de bem-estar pobre
são as instalações dos eventos agropecuários, como as baias, que levam o
animal a sofrer com uma redução severa da possibilidade de se
exercitar, causando, ao longo do tempo, fraqueza nas ossaturas e
problemas graves nas articulações, gerando defeitos cada vez mais
severos de aprumos. Muitos fecham os olhos para as necessidades básicas
de bem-estar dos animais de pista por colocarem a corrida do ranking em
primeiro lugar. Durante alguns anos tenho tido a possibilidade de
acompanhar de perto em visitas a haras e no trabalho em exposições, como
muitos proprietários priorizam as disputas por pontos, o que os faz
enxergar os eqüinos como “objetos”, não como “animais”.
Nem sempre oferecer ao animal a melhor
ração e suplementá-lo com tudo que é de direito significa tratá-lo bem.
Estamos sempre diante de exemplos clássicos de cólica em exposições,
problemas que poderiam ser evitados por um manejo de alimentação mais
adequado e cuidadoso. É claro que a alimentação não é o único fator que
leva a esses tipos de quadros - o calor e o estresse influenciam
bastante – mas é preciso levar em conta a quantidade de ração e
suplementação que um eqüino necessita para suprir suas reais
necessidades, não oferecendo quantidades exageradas em busca de
condições corporais ideais em curtos intervalos de tempo.
Confinamento dos Jovens
Também por causa das expos, vemos hoje
em dia potros cada vez mais jovens sendo confinados, tendo subtraída a
sua liberdade de correr livremente e se socializar com os outros
animais, sendo submetidos a baias ou limitados a piquetes, coisas que
geram problemas cada vez mais graves de aprumos e tornam os animais
cada vez mais obesos em fases delicadas do desenvolvimento. Esses dois
fatores, em conjunto com exercício em pisos duros, ocasionam, dentre
vários problemas de aprumo, um muito comum chamado “síndrome do
navicular”, desordem crônica progressiva, caracterizada por alterações
no osso navicular e seus ligamentos, no tendão do músculo flexor digital
profundo e na bolsa do navicular.
Também chamada de Podotrocleose, essa
patologia ocorre devido a grandes forças aplicadas sobre essas
estruturas durante o movimento, em que a extensão da articulação distal
empurra o tendão do músculo flexor digital profundo contra o aspecto
palmar do osso navicular (TEICHMANN, 2005), causando uma dor intensa e
crônica que resulta em claudicação. Vale ressaltar que, na Nacional
deste ano, vários animais se apresentaram claudicando durante os
julgamentos, tendo sido diagnosticada, após exame específico, a síndrome
do navicular em um deles.
Embocaduras e baias
Quando nos referimos a embocaduras, ao
contrário do que é visto em outras raças, os proprietários e treinadores
de Campolina muitas vezes não buscam auxílio de profissionais
especializados, a fim de que seja produzida uma embocadura específica
para cada animal ou, ao menos, buscar embocaduras mais adequadas à
constituição bucal de cada indivíduo. Isso significa respeitar sua
arcada dentária, largura de boca e profundidade de palato, fazendo com
que um freio ou um bridão fique perfeitamente ajustado à boca do animal.
Na nossa raça, notamos durante julgamentos, animais brigando
constantemente com embocaduras visivelmente inadequadas para eles, assim
como é comum ver barbelas extremamente apertadas com a intenção de
criar andamentos e posturas de cabeça artificiais, o que gera lesões com
sangramentos nos animais.
Durante as exposições comprovamos que os
tratadores, assim como a organização do evento, também contribuem para
um baixo grau de bem estar dos animais. Em relação à organização,
podemos citar a falta de vigilância quanto à qualidade dos fenos e
capins oferecidos aos animais; quantidade e qualidade de material para
ser colocado como cama nas baias, o que provoca lesões no corpo dos
animais, além de intoxicações quando o animal ingere ou inala o
material. A posição das baias em relação ao sol e o material com que
estas são feitas também podem ser prejudiciais, gerando estresse devido
ao desconforto térmico e à alteração que provocam no metabolismo do
animal.
Quanto à apresentação em pista, é muito
comum ver os animais inquietos, com olhares fixos nos apresentadores -
muitas vezes, relutando em ficar próximos a eles e sendo até agressivos,
empinando e indo na direção do treinador para mordê-lo. Situações assim
constatam a reação de esquiva - um sinal de grau baixo de bem estar, o
que demonstra que o animal está com medo e na espera de alguma
repreensão árdua do seu apresentador. Os apresentadores, por suas vezes,
além do nervosismo devido ao momento da competição, se sentem
pressionados a dominar o animal, muitas vezes através da violência.
Novamente, os pontos interferem no bem estar dos animais.
Conclusão
Poderia continuar escrevendo mil páginas
sobre esse assunto, pois o que não faltam são tópicos a serem
abordados, mas finalizarei o artigo com uma frase do naturalista e
humanista Alexander Von Humboldt, que diz que "A civilização de um povo se avalia pela forma que seus animais são tratados".
Com esta reflexão, espero ter tocado cada um de vocês para que, a cada
dia que passe, tratadores e proprietários possam enxergar o nosso cavalo
como um ser vivo que, apesar de não conseguir se expressar com
palavras, sofre, tem sentimentos, direitos e deve ser tratado com
respeito.
Alguns sinais de bem estar precários são
evidenciados por mensurações fisiológicas - como aumento de freqüência
cardíaca, atividade adrenal, resposta imunológica reduzida após um
desafio - e por comportamentos anormais - como, por exemplo,
estereotipias, automutilação e agressividade em excesso. O ato do animal
se esquivar fortemente de um objeto, evento ou pessoa também fornece
informações sobre seus sentimentos e, conseqüentemente, sobre seu bem
estar. Quanto mais forte a reação, mais pobre se encontra seu bem estar.
(BROOM;MOLENTO, 2004)
Ana Carolina Passos Fonseca**Graduanda em Medicina Veterinária no 9º semestre da Faculdade Unime.
Comentários
Postar um comentário